segunda-feira, 19 de março de 2012

O Reincidente TSE

O TSE vem se consolidando como promotor de inconstitucionalidades. Como na Ficha Limpa, quando ignorou a Anualidade da lei eleitoral (sanada no STF), renova o descaso com este Princípio constitucional ao exigir, na forma da Resolução 23.376/2012 (Art. 52, §2º), a aprovação das contas referentes a 2010 dos postulantes a cargos eletivos nas eleições 2012, para aquisição da Quitação Eleitoral e, consequentemente, o Registro de Candidatura, para as eleições municipais de outubro. Neste ato, consegue o inimaginável: unir contrariamente ao entendimento da corte dezoito Agremiações partidárias, “gregos e baianos”.

Antes, do muito que li em reportagens e nas redes sociais, percebo necessário um esclarecimento acerca do vocábulo “contas”, haja vista a confusão que se apresenta quando se afirma, indevidamente, se estar a rasgar a Lei da Ficha Limpa quando se entende inconstitucional - ao menos quanto ao momento da aplicação da interpretação do órgão máximo da Justiça Eleitoral - o “desaprovar as contas” no texto resolutivo. As “contas” a que se refere a Resolução em destaque dizem respeito às “contas de campanha” de candidatos, com previsão na Lei 9504/97 (Arts. 28 a 32), enquanto a Ficha Limpa (LCO 137/2010, alteradora da 64/90 – especificamente Art. 1º,I, g) aponta para as contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas, ou seja, contas de gestão. Portanto, neste ponto, não há como entender atingida a Ficha Limpa, pois é das primeiras que trata a Resolução atacada. Mas em outro foi ela alterada, ou como quer a maioria dos ministros do TSE, estendida. Veremos adiante.

O Principio da Anualidade está guardado no Art. 16 da Constituição republicana e é de clareza solar o que assevera: “A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência.” Como absorver que a mais alta corte da Justiça Eleitoral através de ato administrativo editado em ano eleitoral queira e possa promover significativa alteração neste processo? Nesse sentido, a exemplo do que em 2010 ocorreu quando entendeu válida para as eleições daquele ano - revisto no STF - a vigência da Ficha Limpa, e antes, em 2008, torrente de ações serão impetradas, indicativo mais evidente de introdução extemporânea de alteração no processo eleitoral. Ou o TSE revê, conforme pedido dos Partidos, seu entendimento, ou estes proporão ADI junto ao STF contra o ato inconstitucional. 

Cabe salientar, sem receio de incredulidades, que o Art. 52, §2º do ato administrativo em comento nada mais é que a reedição do Art. 41,§3º da Resolução TSE nº 22.715 de 2008, revogado tacitamente pela Lei 12.034/2009, que incluiu no Art. 11 da Lei 9.504/97 o §7º. Às claras: o §2º (repetente) da questionada Resolução TSE afirma que “a decisão que desaprovar as contas de candidato implicará o impedimento de obter a certidão de quitação eleitoral”. Por sua vez, a norma eleitoral, elaborada em devido processo legislativo, dispõe que “A certidão de quitação eleitoral abrangerá (...) e a apresentação de contas de campanha eleitoral.” Em outras palavras: primeiro entendeu o TSE que o postulante à condição de candidato que tivesse as contas desaprovadas não receberia a Quitação. Posteriormente, no uso de suas atribuições constitucionais de legislar, o Congresso Nacional elabora e aprova Lei que exige para a Quitação, somente a apresentação das contas de campanha. Finalmente, volta o TSE a afirmar, pisando no Poder Legislativo, contrariando a Lei, que contas julgadas e desaprovadas implicam no impedimento à obtenção da Quitação. Nota-se por parte de quem deveria fazer cumprir a lei estrita, a opção por legislar. O legislador entende suficiente a apresentação das contas de campanha para obtenção da Quitação Eleitoral, o TSE vai além e exige o mérito. 

Afirmaram os ministros Ricardo Lewandowsky, presidente do TSE, Carmen Lúcia, Marco Aurélio e Nancy Andrighi, que formaram a maioria que aprovou a Resolução, que a mera apresentação da contabilidade da campanha, sem juízo de valor sobre os números, não comprova a idoneidade do político. Nem sua inidoneidade, digo eu. Além do que, não seria isto que deveria prevalecer, uma vez que a Lei não permite extensão para entendimento por ela revogado, veio para produzir efeitos contrários ao que entendia o Tribunal (necessário exame de mérito) e pacificar a necessidade de apenas apresentar as contas de campanha a cada eleição.

Reincidente, pois, em inconstitucionalidade por desacatamento ao Princípio da Anualidade eleitoral, o Tribunal Superior Eleitoral agora se apresenta como editor de antinomias. É espantoso e lastimoso!

Doutrinadores asseverarão que o ato normativo reeditado (Art. 52, §2º) é desprovido de eficácia, pois divergente e conflitante com Lei Federal específica (Art. 11 o §7º, Lei 9.504/97), senão vejamos: “O hierárquico (`lex superior derogat legi inferiori`), baseado na superioridade de uma fonte de produção jurídica sobre a outra. O princípio Lex superior quer dizer que um conflito entre normas de diferentes níveis, a de nível mais alto, qualquer que seja a ordem cronológica, terá preferência em relação à de nível mais baixo. Assim, p.ex., a Constituição prevalece sobre uma lei. Daí falar-se em inconstitucionalidade ou de ilegitimidade de atos normativos diversos da lei, por a contrariarem.”, Maria Helena Diniz.

Sobre a aplicação concreta do ato ilegítimo, caso prevaleça (nada mais me espanta), deixo duas questões: estariam todas as contas de todos os candidatos nas eleições 2010 julgadas? Seria razoável entender que dentre dois adversários políticos em determinado município a Justiça Eleitoral tenha julgado e rejeitado as contas de um, tornando-o inelegível, e não tenha julgado as do outro, assegurando a este a condição de candidato?

No mérito, negar a Quitação Eleitoral a quem tenha contas de campanhas anteriores rejeitadas, impedindo-lhe o direito político passivo - observadas as garantias constitucionais do então candidato -, parece-me interessante e saneador, desde que a proposição siga o devido processo legislativo, atente para Anualidade e tenha a Justiça Eleitoral condições de promover as análises das contas de todos os interessados no processo, observando o Princípio da Isonomia ou Igualdade.

sexta-feira, 16 de março de 2012

O TSE e o Twitter


Pensemos numa hipótese em que o cidadão Fulano de Tal, escolhido em convenção partidária candidato a vereador pelo Partido Midiático Brasileiro, no município de Midialândia, dois dias antes do dia 06 de julho (data a partir da qual a Lei das Eleições permite a propaganda eleitoral), realiza uma reunião física, presencial com seus multiplicadores a fim de entregar-lhes material de propaganda eleitoral a ser distribuído ao eleitorado, conforme a lei das eleições. Estaria ele realizando propaganda eleitoral antecipada, extemporânea?

Pensemos noutra hipótese: o cidadão Fulano de Tal, escolhido em convenção partidária candidato a vereador pelo Partido Midiático Brasileiro, no município de Midialândia, USUÁRIO DO TWITTER sob a alcunha @FulanoDeTal , dois dias antes do dia 06 de julho, oferece aos seus seguidores (multiplicadores virtuais), material de propaganda eleitoral, por meio desta rede social, a ser retransmitido ao eleitorado (seguidores de seus seguidores), conforme a lei das eleições. Estaria ele realizando propaganda eleitoral antecipada, extemporânea?

Agora pensemos no que poderia diferenciar as condutas de Fulano de Tal nas hipóteses levantadas. Enxergo apenas uma diferença: o modo de entrega do material, uma vez que na primeira hipótese o fez presencialmente e na segunda virtualmente, já que podemos facilmente equiparar as figuras dos multiplicadores (físicos e virtuais) como aqueles que farão, voluntariamente ou não, a divulgação do candidato. No mais, o tempo da distribuição do material é o mesmo, tal como a finalidade e a orientação.

Assim como os multiplicadores da primeira hipótese foram ao encontro do candidato, voluntariamente, com um ou outro interesse, não importa, o foram, também, os da segunda, ora! Estes - seguidores na linguagem da referida rede social - são ávidos por informações daquele, e mais, são livres para, a qualquer momento, deixarem de segui-lo, e até mesmo se absterem da retransmissão da propaganda.

Nas palavras do Ministro Gilson Dipp em seu voto vista, vencido: “No Twitter não há a divulgação de mensagem para o público em geral, para destinários imprecisos, indefinidos, como ocorre no rádio e na televisão, mas para destinatários certos, definidos. Não há no Twitter a participação involuntária ou desconhecida dos seguidores. Não há passividade das pessoas nem generalização, pois a mensagem é transmitida para quem realmente deseja participar de um diálogo e se cadastrou para isso”.

Entenderia o Tribunal Superior Eleitoral-TSE que na primeira hipótese a conduta de Fulano de Tal seria absolutamente legal, pois fechada e sem repasse a terceiros. Já no julgamento do REC na Representação Nº 182524 DF, por maioria (4 a 3), o TSE passa a entender (ao menos até pronunciamento do Supremo Tribunal Federal-STF, provocado) que a conduta de divulgação de candidato, mesmo a voluntários multiplicadores, seguidores (não terceiros), através da Rede Social Twitter (portanto, fechada), antes do dia 06 de julho, caracterizaria ilícito passível de multa.

Enfim, para as eleições 2012, Fulano de Tal poderá entregar material com propaganda eleitoral antes do dia 06 de julho, somente fisicamente. Se o fizer virtualmente estará cometendo um ilícito. 

Aceite, candidato, pois assim decidiram as maiores autoridades em Direito Eleitoral.