quarta-feira, 29 de junho de 2011

EM DEFESA DO VOTO PROPORCIONAL EM LISTA ABERTA

A Lista eleitoral é um rol de candidatos que cada partido ou coligação partidária, após homologação em suas convenções, apresenta ao cidadão-eleitor para a disputa de determinadas eleições. Admite, predominantemente, pois pode haver variações, duas alternativas: a aberta, utilizada entre nós e outros poucos países da Europa e América do Sul, e a fechada, predominantemente européia, também utilizada em países da América do Sul, da África e por Israel.

De maneira simplória, poderíamos supor que, se utilizada em muito mais países, a lista fechada teria mais vantagens que a aberta, mas devemos levar em conta elementos como história, identidade, população, extensão territorial, dentre outros, na formação de uma adequada conclusão.

A diferença essencial entre ambas está na escolha que o cidadão-eleitor fará. A aberta permite a este votar no candidato de sua preferência constante da lista, ou tão somente na legenda partidária ou da coligação, enquanto a fechada não permite outra senão o voto no partido ou coligação, e os eleitos serão aqueles predeterminados em suas convenções, ou mesmo indicados pelas cúpulas partidárias.

Entre nós, a introdução do voto proporcional em lista aberta data de 1932, tendo sofrido alguma alteração, principalmente por conta da demorada apuração, para as eleições de 1935, mas estas só foram de fato concretizadas em 1945, após o Estado Novo, o 1º governo do Presidente Getúlio Vargas, por razões óbvias. E assim tem sido, com pontuais e jamais essenciais modificações, até os dias de hoje. Trata-se, portanto, de uma tradição.

Instalada nessa legislatura no Senado Federal a Comissão da Reforma Política, sempre anunciada e jamais praticada, surgiram pelo menos três propostas de alteração do atual modelo eleitoral, que não diríamos originárias dos partidos políticos PT, PSDB e PMDB, mas daqueles “iluminados” chefes dos mesmos, pois não temos conhecimento de qualquer discussão interna partidária nesse sentido, muito menos com suas bases.

Colocadas em votação na referida Comissão, saiu vitorioso o modelo de voto proporcional com lista fechada para a eleição de deputados federais, estaduais e vereadores. Significa dizer que serão eleitos tantos quantos o partido ou coligação obtiver de cadeiras em determinada casa legislativa, de acordo com as prioridades elencadas na lista. Por exemplo: se o partido A obteve 02 cadeiras para a casa legislativa L, os eleitos serão os dois primeiros da lista, e assim sucessivamente.

Sabedores de que a verdade humana será eternamente parcial, buscamos Drummond em A Verdade Dividida para nos confortar ante nossas desilusões e prepotências: “...Chegou-se a discutir qual a metade mais bela. Nenhuma das duas era perfeitamente bela. E era preciso optar. Cada um optou conforme seu capricho, sua ilusão, sua miopia.”

Usamos deste conforto, embora ainda restem etapas que poderão alterar a proposta da Comissão, para apresentar mais tranquilamente o que entendemos ser mais adequado quando tratamos de Reforma eleitoral, a correção de uma extravagância em nosso atual sistema proporcional: a eleição de uns pouco votados na “carona” dos votos de outros.

Casos emblemáticos estão na nossa história eleitoral, como nas eleições de 2002 para a Câmara Federal em que o candidato por São Paulo, Enéas Carneiro (PRONA), obtendo mais de 1 milhão e meio de votos “arrastou” para aquela casa outros cinco, e quatro destes foram diplomados e empossados tendo obtido 673, 484, 382 e 275 votos. Uma demostração evidente de que o sistema necessita revisão; que este é seu calcanhar de Aquiles.

Não concebemos a mudança de um modelo tradicional como o nosso em que o eleitor-cidadão pode optar pelo voto pessoal ou partidário por outro que o intime a escolher somente um partido, a ser impedido de personificar seu voto. Não seria razoável que desta forma se venha a afirmar que estaríamos fortalecendo a instituição partido político, pois esta já é absolutamente fortalecida tanto pelo Código Eleitoral, que somente admite candidatura de filiados, como pelo Supremo Tribunal Federal que entendeu pertencer o mandato parlamentar ao partido político.

Corrigir a extravagância é o que entendemos ser o melhor, a nossa “metade mais bela”. Nesse sentido, propomos um modelo misto proporcional e majoritário.

As eleições para as casas legislativas se dariam da mesma forma que hoje a realizamos, mas seus resultados sofreriam alterações substanciais no que se refere à representatividade do eleito.

O que determina o número de cadeiras para determinado partido ou coligação é o Quociente Eleitoral (QE). Este é obtido dividindo-se o total de votos válidos na eleição para determinado parlamento pelo número de parlamentares que compõem este mesmo parlamento. Exemplificando: no Rio de Janeiro, nas eleições para deputado federal em 2010, foram computados 7.998.710 votos válidos. O estado dispõe de 46 cadeiras neste parlamento. Portanto o QE foi de 173.885 votos.

O sistema atual afirma que cada vez que um partido ou coligação obtenha 1 QE, este obterá uma cadeira, e tantas cadeiras quantos QEs atingir. Não importa se apenas um de seus canditados obteve sozinho 2 ou mais QEs em votos, os imediatamente mais votados que aquele no partido ou coligação (caso Enéas) estariam também eleitos. Curiosamente, outros candidatos de outros partidos ou coligações mais votados que estes últimos não obteriam suas eleições.

Propomos restringir a eleição daqueles que não atinjam determinado percentual (20% talvez) do QE e transferir estas vagas aos mais votados que não obtiveram suas eleições. Dessa forma, os partidos que proporcionalmente obtiverem X cadeiras, as ocuparão apenas por aqueles que tiverem alcançado o mínimo de votos estabelecidos pelo percentual (os 20%), enquanto as demais, não preenchidas pela insuficiência de voto de seus candidatos, seriam transferidas para o sistema majoritário, em ordem decrescente, dentre os mais votados e não eleitos proporcionalmente, pertençam a que partido ou coligação pertencerem, pois importará o número de votos por estes obtidos.

Adotado este modelo, os partidos ou coligações que não dispuserem da totalidade de suas cadeiras na forma proporcional devido ao percentual limitativo, terão destinado as mesmas à ocupação na forma majoritária.

De toda sorte, acreditamos que a sociedade deva se manifestar por meio de referendo sobre as decisões que envolvem o sistema eleitoral, já que, como dissemos, as propostas debatidas e a consagrada saíram das mentes de caciques partidários. Não mereceram debate ou consulta. Entendemos que este tema seja de interesse direto do cidadão-eleitor e que este deva se manifestar diretamente, na forma da Constituição, não sendo suficiente, nesse caso, a representação que delega aos “iluminados”.

3 comentários:

  1. Carlos, eu nunca gostei de Direito Eleitoral.talvez seja trauma. Mas nao deixa de ser essencial
    dias felizes

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  2. Excelente texto, Carlos, nitidez e coerência.

    Abraços!

    @soniasalim

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  3. Excelente texto meu caro.
    Esse é o nivel dos debates que devem ter sobre qual o sistema que deveremos adotar, e não os conchavos feitos nos escuros do gabinetes.
    òtimo.

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