quarta-feira, 22 de junho de 2011

A Lei do Salário Mínimo e as Razões para o Controle de Constitucionalidade

A Lei Ordinária 12.382/2011, oriunda do Projeto de Lei nº 382/2011 de autoria do Poder Executivo, além de fixar o valor do salário mínimo (SM) a viger em 2011 (art. 1º e Parágrafo único) e estabelecer diretrizes para a fixação dos salários mínimos de 2012 a 2015 (art. 2º, Parágrafos e Incisos), dentre outras disposições, apresenta, no mínimo, uma controversa novidade.

Pretende a Lei - que entendemos, em parte, inconstitucional -, no período descrito acima, mudar a forma de regulamentar o salário mínimo nacional, fazendo-a através de Decreto e não de Lei (art. 3º e Parágrafo único).

Nesse sentido, o Executivo dá sinais de desprezo pelo Poder Legislativo, pois retira deste a capacidade de apreciar, discutir e alterar o que emana daquele.

Não diríamos que a Presidente se inspirou no Absolutismo europeu, mas a edição do PL do SM, senão pela matéria ao menos pela forma, nos remete às Idades Média e Moderna, períodos em que brotou e se desenvolveu esta forma de governo que concentrava em uma pessoa ou grupo social o poder sobre o Estado.

Quando aceitamos e defendemos a fixação do SM por Decreto afirmado promover a segurança às relações sociais por conhecermos a regra da suposta evolução do SM, ou sob qualquer outro argumento, prestigiamos uma política (salarial) de governo - transitória como o próprio - em detrimento da rigidez constitucional, pela via de pô-la em prática, operando uma alteração constitucional sem o devido processo legislativo.

Todo governo tem o poder de, à sua análise, propor a política que considere a mais adequada, porém, tem o dever de observar e obedecer as regras estabelecidas pela Constituição e pelas Leis. Não nos surpreende que o Executivo não siga a tramitação adequada, haja vista, e não justificando, o anseio por celeridade, mas nos cobre de desesperança a passividade do Legislativo (Câmara e Senado) diante de tamanha e assombrosa intromissão em suas típicas funções constitucionais.

De todo modo, preocupa-nos sobremaneira que um governo com folgada maioria nas duas Casas legislativas lance mão de impróprio procedimento para fazer valer sua vontade.

Desconstruamos, pois, à luz da Carta Maior, o que a nova norma - especialmente o art. 3º e seu Parágrafo único - apresenta e propõe mudar na vida político-jurídica do país.

A Constituição Federal (CF) afirma expressamente ser direito do trabalhador urbano e rural (art. 7º), dentre outros, o salário mínimo, fixado em Lei (inciso IV). Quisesse o constituinte originário que a matéria fosse tratada apenas na alçada executiva teria se expressado de outra forma, mas, ao contrário, atribui ao salário mínimo status de direito social e garantia fundamental do trabalhador, e houve por bem dispô-la às Casas legislativas.

As várias competências privativas do Presidente da República estão disciplinadas no art. 84, CF, e nenhuma faz referência à fixação do salário mínimo, o que impõe a participação do Legislativo na apreciação da matéria, na forma do art. 64, Caput, CF.

A Separação dos Poderes, Princípio Fundamental previsto no art. 2º, CF, não é afrontada quando determinado Poder republicano exercita funções atipicas à sua e típicas de outro, desde que haja previsão legal que autorize essa exceção, conforme observamos no mesmo artigo 84 acima citado, em seu inciso VI, que assegura o uso do Decreto pelo Executivo, porém, somente sobre:

a) organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos;

b) extinção de funções ou cargos públicos, quando vagos.

Como vemos, apenas no artigo 84 da Carta Maior encontramos dois empecilhos à nova norma: a incompetência do Executivo para tratar privativamente da matéria salário mínimo, bem com a forma de apresentá-la.

Não podemos restringir esta grave afronta à Constituição e pensar que estamos a tratar somente da forma de proposição de um instituto. Está em jogo a democracia brasileira quando um Poder usurpa de outro suas funções; quando o Executivo através de Lei - mesmo aprovada pelas Casas legislativas – textualiza que a partir da publicação dessa Lei fará o que lhe impede ou não lhe autoriza a Constituição da República.

Diante destas e possivelmente outras evidências de inconstitucionalidade, os Partidos Políticos de oposição DEM, PPS e PSDB protocolaram Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal a fim de trazer de volta a segurança jurídica, política e institucional à vida brasileira. Esperamos, pelo que acima demonstramos, o entendimento da Corte Constitucional em controle concentrado das normas, no sentido de declarar o artigo 3º e Parágrafo único da Lei 12.382/2011 inconstitucionais quando do julgamento da referia ADI.


A Lei 12.382/2011 aqui http://www.planalto.gov.br/ccivil/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12382.htm