quinta-feira, 24 de maio de 2012

Sistema Eleitoral Misto


Sabedores de que a verdade humana será eternamente parcial, buscamos Drummond em “A Verdade Dividida” para nos confortar ante nossas desilusões e prepotências: “Chegou-se a discutir qual a metade mais bela. Nenhuma das duas era perfeitamente bela. E era preciso optar. Cada um optou conforme seu capricho, sua ilusão, sua miopia.”

Usamos deste conforto para apresentar mais tranquilamente o que entendemos ser mais adequado quando tratamos de sistema eleitoral, da correção de uma extravagância em nosso atual sistema proporcional: a eleição de uns pouco votados na “carona” dos votos de outros.

Casos emblemáticos estão na nossa história eleitoral, como nas eleições de 2002 para a Câmara Federal em que o candidato por São Paulo, Enéas Carneiro (PRONA), obtendo mais de 1,5 milhão de votos, “arrastou” para aquela casa outros cinco, e quatro destes foram diplomados e empossados tendo obtido 673, 484, 382 e 275 votos. Uma demonstração evidente de que o sistema necessita revisão; que este é seu calcanhar de Aquiles.

Não concebemos a mudança de um modelo eleitoral tradicional como o nosso em que o eleitor-cidadão pode optar pelo voto pessoal ou partidário, por outro que o intime a escolher somente um partido; o impeça de personificar seu voto. Tampouco seria razoável que desta forma se venha a afirmar estar-se fortalecendo a instituição partido político, pois esta já é absolutamente fortalecida tanto pelo Código Eleitoral (art. 87), que somente admite candidatura através de registro partidário, quanto pelo Tribunal Superior Eleitoral e pelo Supremo Tribunal Federal, que entendem pertencer o mandato parlamentar ao partido político, salvo especiais condições, e continuará a sê-lo em nossa proposta, como se poderá notar adiante.

Corrigir a extravagância é o que entendemos ser o melhor, a nossa “metade mais bela”. Nesse sentido, propomos um modelo misto proporcional e majoritário.

As eleições para as casas legislativas (exceto o Senado) se dariam da mesma forma em que hoje a realizamos, mas seus resultados sofreriam alterações substanciais no que se refere à representatividade do eleito.

O número de cadeiras hoje obtido por determinado partido ou coligação é indicado pelo Quociente Partidário (QP), encontrado na divisão do número de votos válidos dados à mesma legenda ou coligação de legendas, desprezados a fração, pelo Quociente Eleitoral (QE). Este é obtido dividindo-se o total de votos válidos na eleição para determinado parlamento pelo número de cadeiras que compõem este mesmo parlamento. Exemplificando: no Rio de Janeiro, nas eleições para deputado federal em 2010, foram apurados 7.998.710 votos válidos. O estado dispõe de 46 cadeiras neste parlamento. Portanto o QE, para o cargo referido, foi de 173.885 votos.

O sistema proporcional atual afirma que cada vez que um partido ou coligação alcance 1 QE, obterá uma cadeira, e tantas cadeiras quantos QEs alcançar. Não importa se apenas um de seus candidatos obtém sozinho 2 ou mais QEs em votos, os imediatamente mais votados que aquele no partido ou coligação (caso Enéas) estão também eleitos. Curiosa e espantosamente, outros candidatos de outros partidos ou coligações mais votados nominalmente que estes últimos não terão a mesma sorte, suas eleições.

O Sistema Eleitoral Misto.

Propomos fazer cessar a eleição daqueles que não atinjam o mínimo de 20% (vinte por cento) do QE na eleição a qual disputou e transferir estas vagas aos mais votados que não obtiveram suas eleições. Desta forma, os partidos que proporcionalmente obtiverem X cadeiras, as ocuparão apenas por aqueles que tiverem alcançado o mínimo de votos estabelecidos pelo percentual (os 20%), enquanto as demais, não preenchidas pela insuficiência de votos de seus candidatos, seriam transferidas para o sistema majoritário, em ordem decrescente, dentre os mais votados e não eleitos proporcionalmente, pertençam a que partido ou coligação pertencerem, pois importará o número de votos nominais por estes obtidos.

Adotado este sistema misto, os partidos ou coligações que não dispuserem da totalidade das cadeiras (QPs) devido ao percentual limitativo (salvo a exceção a seguir) terão destinado as mesmas à ocupação na forma majoritária.

Poderão ocorrer casos em que um partido ou coligação venha a obter 1 ou mais QPs, mas nenhum de seus candidatos alcançado o percentual mínimo que respalde sua representatividade como eleito. Nestes, apenas, entendemos razoável a eleição do mais votado (apenas deste), pois assim estaríamos assegurando e prestigiando o princípio partidário, bem como sendo coerentes com o que consideramos essencial: a representatividade advinda do voto nominal. Por isso admitimos a exceção, destinando a cadeira àquele partido.

Trata-se, pois, de enorme diferença em relação ao engodo do “puxador de legenda”. Este não traz consigo a grandeza e substância dos partidos ou coligações, mas sua identidade nominal, somente. E esta reflete, equivocadamente, o tamanho do partido, e as consequências deste equívoco recaem na participação no Fundo Partidário, no tempo de veiculação de propagandas partidária e eleitoral gratuitas, dentre outras, a nosso ver, ilegítimas prerrogativas.  É esta a distorção, o equívoco do sistema proporcional.

Concluímos haver, claramente, diferença imensa entre um partido ou coligação que obtém representatividade parlamentar, mesmo que o eleito não tenha atingido o mínimo percentual exigido por lei (futura), e outro que é representado por notórios irrelevantes em densidade eleitoral, “puxados” pela tolerância ou frouxidão do sistema vigente.

Nossa proposta não visa enfraquecer partidos, como se pode observar, mas formar as casas legislativas de modo a que representem, verdadeiramente, a vontade mais próxima do eleitor.

Para tanto, torna-se necessária a proposição de lei alteradora do Código Eleitoral (lei nº 4.737/65), especialmente sua PARTE QUARTA, TÍTULO I, que trata DO SISTEMA ELEITORAL. E aqui indicamos as alterações, bem como a justificação.

De toda sorte, entendemos que o cidadão-eleitor deva se manifestar por meio de referendo sobre as decisões que envolvem o sistema eleitoral, na forma da Constituição, não sendo suficiente a representação que delega aos “iluminados”, muitos destes, caronas eleitorais.